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Churrasco do milênio

Publicado por Caio Gottlieb em

Por Nilso Romeu Sguarezi*

Um setentão convidou 17 amigos para um churrasco. Nenhum dos convidados tinha menos de 70 anos e somadas suas idades passaram bastante dos mil anos, daí denominarem o almoço de “Churrasco do Milênio”.

Outra exigência do anfitrião é que seus filhos, todos casados, participassem com os cônjuges do almoço, para aferirem a memória fantástica dos convidados e suas incríveis histórias e estórias.

Mas este espirituoso amigo é um inveterado perfeccionista. Tudo o que faz é resultado de planejamento meticuloso que vai amadurecendo na sua fantástica capacidade de criar e realizar novos projetos ou inovar onde outros não acreditavam ser possível aquilo que ele acaba realizando. Desnecessário dizer que seus convidados sabendo do seu objetivo, qual seja que seus filhos conhecessem histórias e estórias dos amigos, chegaram para o almoço na expectativa de também ouvirem relatos dos mais variados, desde os reais aos mais fantásticos sempre revestidos de uma boa dosagem de invencionices na medida que o bom whisky e vinho fossem fazendo seus efeitos.

Era um grupo multifacetário, porquanto, apesar da longevidade a absoluta maioria ainda estava em plena forma e atividade, além de super inseridos na realidade social, empresarial, política e religiosa. Empresários do comércio, indústria, construção, agronegócio, políticos, advogados, pilotos de aeronaves e churrasqueiros com dotes de culinária das mais refinadas e exigentes gastronomias.

Contar a estórias deste almoço – que promete se repetir – um simples texto seria tarefa impossível, mas vale separar algumas que marcaram pelo ineditismo das narrativas.

Quando a conversa girou em torno da profissão mais longeva um octogenário advogado saiu com esta: Dr. Pompeu, famoso advogado, ao completar 95 anos decidiu se aposentar e mudou residência da capital para sua cidade natal no interior mineiro, com pouco mais de 2 mil habitantes. A presença do famoso advogado foi notícia e comentários para todo mundo na pequena cidade. O padre e pastor local, sabendo que o famoso advogado era ateu, decidiram de comum acordo que iriam convertê-lo ao cristianismo e passaram a visitá-lo constantemente. Eram longas discussões para converter o herege que permanecia imune à todas as orações e pregações bíblicas dos esforçados religiosos para salvar aquela alma. Uma saúde de ferro do velho causídico não denotava nada que precisasse de cuidados médicos. Foram quatro anos de pregação dos religiosos totalmente infrutíferas.

Avizinhava-se o aniversário dos cem anos do herege Pompeu, quando inesperadamente correu a notícia de que ele foi levado às pressas para o hospital. Como um rastilho de pólvora a informação chegou ao padre e pastor que decidiram irem juntos visitar o velho causídico que já se tornara amigo dos dois.

Ao chegarem ao quarto, foram surpreendidos ao notarem que deitado no leito hospitalar o velho manuseava uma bíblia e fazia anotações num caderno. Padre e Pastor se entreolharam, se abraçaram e louvaram à Deus pela vitória de terem conseguido a conversão do incrédulo. Um de cada lado da cama se aproximaram lhe dando bençãos pelo milagre da conversão.

Foram interrompidos pelo quase centenário advogado que lhes explicou: “Não é nada disso que vocês estão pensando. Não me converti porra nenhuma. Estou vendo aqui na lei de vocês, esta tal de bíblia, como preparar minha defesa se vier depois da minha morte, me acusarem e julgarem por não ter caído na conversa de vocês”

Rindo a valer o advogado sentenciou. “Viram, para continuar advogando, basta manter a memória e nada mais que isso”.

Depois desta foi o decano do grupo que contou ter participado da festa de Bodas de Ouro dos 50 anos de aniversário de casamento de um seu amigo. Assim ele relatou: “A igreja estava lotada, mais de quinhentos convidados assistiam a missa que o padre rezou em Ação de Graças para o casal Amélio e Amélia.

Terminada a missa o padre posicionou-se entre marido e esposa, agora os três voltados de frente para seus convidados, com microfone na mão o padre falou: “Agora vamos ouvir os depoimentos destas duas pessoas maravilhosas que por 50 anos mantiveram este santo casamento e formaram esta maravilhosa família e hoje conseguiram lotar nossa igreja com seus amigos”. Passando o microfone para a esposa Amélia pediu “Dona Amélia, nos conte qual a fórmula de manter esta união e formar esta linda família”. A esposa que nunca havia falado em público, tremeu e empalideceu, mas disse: “Padre, o senhor sabe nós não faltamos a missa dos domingos, lá em casa rezamos diariamente o rosário e cada um de nós tem seus santos protetores” Foi entusiasticamente saudada com uma salva de palmas pelos convidados. O padre retomou o microfone e tentou passar para o esposo Amélio que não estendeu a mão para pegar o aparelho. Então o padre levantou a mão colocando o microfone perto da boca do marido para que ele falasse. Este permaneceu em silencio. O padre insistiu “Vamos lá seu Amélio, conte aos seus amigos o que um marido deve fazer para ter uma família numerosa como a sua, manter o casamento e reunir tantos amigos”. O marido continuou calado e o padre insistiu; “vamos nos diga alguma coisa sobre esta festa maravilhosa” Meio balbuciando o Amélio disse: “Paciência” e calou-se, mas o padre insistiu. “Nos diga como se mantem por 50 anos um casamento tão maravilhoso”, Amelio repetiu “P a c i ê n c i a”, agora mais alto para que todos ouvissem. O padre voltou a insistir, “qual a fórmula seu Amélio de conseguir esta verdadeira proeza nos dias atuais? Visivelmente nervoso o homem pegou o microfone e sonora e calmamente disse: “A fórmula é ter P A C I Ê N C I A” devolvendo ao padre o microfone, quando então todos os presentes entenderam a mensagem e começaram a rir e depois em pé todos aplaudiram os noivos.

Mas a mais inusitada mesmo foi o próprio anfitrião que saiu com esta: “50 anos atrás eu precisava dar uma garantia da ordem de uns US$10 milhões de dólares para um grande financiamento industrial no Paraná, para o qual nós não tínhamos nem o dinheiro suficiente e nem cadastro. Compramos então uma área imensa no Maranhão por apenas uns US$200 mil dólares, levando para lá o criterioso avaliador do Banco para elaborar o laudo de avaliação, viajando em nosso avião, na época um bimotor. A estratégia para a avaliação foi na verdade sugerida por nosso capataz, um velho nordestino que sabia tocar viola e contar estórias como ninguém e era um cara acostumado com políticos e “gente da cidade grande, que o achava bobo”. Na época, ele ouvindo nossa conversa sobre o assunto, nos disse: “Doutor, vamos pintar de branco os milhares de cupins que estão aqui espalhados, lá de cima, do avião, ninguém vai saber que não é boi”.

Seguindo a boa ideia do capataz, humilde, mas nada bobo, na viagem, com o avaliador do Banco, sobre uma região pioneira e inóspita da época, propositadamente seguimos de Porto Nacional para Balsas, à tarde, quando normalmente o tempo não é bom e o avião sacode pra xuxu tirando o entusiasmo de qualquer vivente. De Balsas, com o tanque cheio, fomos para a enorme fazenda de gado, onde durante dois meses antes nossos funcionários, sob o comando do capataz, todos humildes, mas inteligentíssimos vaqueiros na região, haviam pintado de branco todos os “cupins”, tão comuns naquela área. Durante o vôo, informamos: “Veja, talvez não seja possível pousar na pista da fazenda porque o gado a invadiu e com as chuvas intensas dos últimos dias, a pista não é segura, mas vai dar pra ver o gado e a enorme área, muito valorizada”. O desgaste nos voos, com tempo ruim, mais a visão a média altura de tantas cabeças de gado vistas do alto, convenceram o criterioso avaliador, com seu estômago embrulhado, de que a fazenda, com tanto gado, valia mesmo os US$10 milhões de dólares da garantia.

Um dos convidados protestou: “Esta eu não engulo” querendo dizer que ninguém acreditaria que cupins pintados de branco, do alto se parecem com vacas e bois. A surpresa mesmo foi quando o decano do grupo falou: “Acredite, parecem gado mesmo, porque o fiscal do banco era eu”.

 

*NILSO ROMEU SGUAREZI, advogado e deputado federal ex-constituinte de 1988, atualmente pregando a necessidade de uma Assembleia Nacional Constituinte Exclusiva, única saída democrática para romper a radicalização política e atrito entre os poderes.

Categorias: OPINIÃO

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