O rei está nu
Certamente ninguém se surpreendeu com o teor das gravações publicadas pelo jornalista norte-americano Glenn Greenwald mostrando, através de mensagens e áudios, que o gabinete do ministro Alexandre de Moraes no Supremo Tribunal Federal usou a máquina da Justiça Eleitoral, então sob seu comando, para forjar documentos que embasaram decisões que ele tomou, e continua tomando, contra apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro e comentaristas políticos de direita nos autos do famigerado inquérito das “fake news”.
Desde que, numa medida arbitrária (à qual, erroneamente, o ex-chefe da nação se curvou), Moraes impediu Bolsonaro de nomear o delegado Alexandre Ramagem para a direção da Polícia Federal, o magistrado, num crescendo assustador, tem se dedicado a transgredir escandalosamente as leis e as normas processuais vigentes no país para investigar, acusar, julgar e punir quem ele bem entende.
Foi ali, no fraquejo de Bolsonaro, que Moraes percebeu que poderia extrapolar impunemente suas funções constitucionais para atender interesses próprios e se transformou no ditador do Brasil, com a devida cumplicidade dos colegas do STF e a leniência do Congresso Nacional.
Há quem esteja vendo semelhanças de forma e conteúdo entre esse nefasto episódio e as conversas de juízes e promotores da Operação Lava Jato, divulgadas pelo mesmo Greenwald, que serviram de pretexto para o STF anular condenações e livrar da cadeia muitos amiguinhos corruptos envolvidos no Petrolão.
É como comparar água e vinho.
Sem cometerem qualquer ilicitude jurídica, os integrantes da Lava Jato cometeram o pecado imperdoável de desbaratar a quadrilha de ladrões de colarinho branco que saquearam os cofres da Petrobras e de outras estatais.
Já as revelações da conduta despótica do ministro Xandão apresenta, pela primeira vez, provas contundentes da prática de abuso de autoridade, cerceamento da liberdade de expressão e perseguição contra cidadãos críticos da atuação de membros dos tribunais superiores, aliados de Bolsonaro e políticos conservadores em geral.
Trata-se, este sim, de um verdadeiro ato antidemocrático.
Nada pode ser mais letal para o estado de direito de uma nação do que ver um juiz dizer para um funcionário, por exemplo, que ele deve aplicar sua “criatividade” para produzir o tipo de relatório que o ministro Moraes estava querendo receber.
No caso, a intenção era “desmonetizar” a revista Oeste – e quando o servidor diz que só encontrou assuntos jornalísticos no material que havia examinado, recebeu a ordem de inventar alguma coisa para satisfazer o ministro. “Ele está cismado”, diz o juiz. “Quando fica assim, é uma tragédia”.
Em outro momento, Moraes se mostra impaciente com a demora no atendimento de suas solicitações. “Vocês querem que eu escreva o laudo?”, diz ele.
Um dos principais alvos da mão pesada de Moraes sobre seus desafetos foi o jornalista Rodrigo Constantino, brindado com o pedido especial para que o relatório contra ele fosse elaborado “no capricho”.
A que ponto chegamos. E vem mais bomba por aí.
É o xerife do STF apanhado em flagrante delito. É a pulada de cerca com registro de impressões digitais. É a marca do batom estampada na cueca.
Se ainda faltava alguma evidência incontestável para consumar a perda de autoridade, legitimidade e respeito da suprema Corte brasileira, agora não falta mais.
E nós, o povo, vamos aguentar tudo isso até quando?