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O Nobel que o Brasil merecia ganhar

Publicado por Caio Gottlieb em

Um grande brasileiro. Um dos maiores brasileiros de todos os tempos. Um homem de visão. Extraordinário. Revolucionário. Um ícone.

O que fez o engenheiro agrônomo Alysson Paolinelli de tão incomum na vida para ser saudado com adjetivos tão eloquentes nas notícias e notas de pesar sobre a sua morte recente e, além disso, ainda ter sido duas vezes indicado por dezenas de entidades nacionais e internacionais ao Prêmio Nobel da Paz?

Depois de ler diversos obituários para registrar no blog um pouco da notável trajetória de Paolinelli, optei pelo inspirado texto, um verdadeiro tributo, escrito pelo também agrônomo Xico Graziano, que foi deputado federal, secretário de Agricultura e Abastecimento de São Paulo e chefe de Gabinete do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Alguns dos principais trechos do seu testemunho:

“Paolinelli era um visionário típico: acreditava em projetos de difícil realização, mirando o futuro. O mineiro de Bambuí, porém, longe de ser lunático, colocava a mão na massa. Tornou-se um construtor da nação.

A história de Paolinelli se confunde com a história de uma verdadeira, embora pouco reconhecida, epopeia nacional: a conquista agropecuária do Centro-Oeste brasileiro. Uma marcha civilizatória, verde-amarela, rumo ao cerrado, a savana brasileira.

O Brasil se notabilizou, desde o ciclo inicial do açúcar, pela ocupação litorânea, associada ao bioma da Mata Atlântica, caracterizado por elevada pluviosidade e umidade. Na economia cafeeira, símbolo do êxito agrícola, famosa era a terra roxa, sinônimo de solo fértil.

Em meados do século passado, o êxodo rural começou a esvaziar o campo fazendo surgir o enorme desafio do abastecimento popular: como alimentar milhões de pessoas que migravam para as cidades. A fome rondava o país.

Nessa época, ocorreu minha cerimônia de formatura na agronomia da Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo), em Piracicaba.

Na ocasião, o paraninfo discursou com entusiasmo sobre uma obra monumental do governo, que no fundo ninguém sabia ao certo o que significava: a expansão da nova fronteira agrícola do Centro-Oeste.

Daqueles locais áridos com suas árvores pequenas e retorcidas viria, graças à moderna agronomia, a solução alimentar para o desenvolvimento brasileiro. Quem falava era Alysson Paolinelli, ministro da Agricultura (1974-79) do governo Ernesto Geisel. Parecia balela.

Cerrado, nem dado. A frase exprimia, então, a visão pessimista existente sobre o potencial agropecuário da região do cerrado brasileiro. Como produzir naquelas terras distantes, ácidas e arenosas, onde pouco chove?

Dois fatores, porém, transformaram dúvidas em certezas. Primeiro, uma decidida estratégia pública ligada à interiorização do desenvolvimento brasileiro. Segundo, uma silenciosa revolução tecnológica, desconhecida inclusive pela maioria dos meus professores na faculdade.

Alysson Paolinelli era um dos comandantes dessa operação que, hoje, é reconhecida como decisiva para lograr o maior sucesso da agricultura mundial nos últimos 50 anos. Quando ele discursou, não era um devaneio; os incautos éramos nós.

Paolinelli não tinha nada de autoritário. Era manso e jeitoso qual os mineiros sabem ser. Educado e atencioso, professor universitário, sua autoridade se firmou sobre a base do conhecimento científico, alimentando-se das informações resultadas dos experimentos agronômicos, a exemplo da importância do uso de pó de calcáreo, uma rocha abundante, para combater a acidez do solo no cerrado.

O grande mérito de Paolinelli foi conseguir juntar a agronomia moderna com o planejamento público e colocar a tecnologia ao lado da política. O governo investiu em logística e na infraestrutura, financiando ademais a expansão da fronteira agrícola.

Até os anos de 1970, o Brasil praticava uma agricultura incipiente, baseada em conhecimento importado, gerado na Europa e nos EUA. Tudo mudou desde então.

Ao reverenciar Paolinelli, reflito sobre nossa carcomida democracia. Goste-se ou não, os militares investiram em grandes obras e traçaram rumos estratégicos. Hoje, os governos se entregam ao imediatismo e ao populismo.

Não se fabricam mais líderes como antigamente. Visionários como Alysson Paolinelli fazem falta, não apenas no agro, mas no Brasil inteiro.

O renomado ex-ministro da Agricultura, o melhor que o Brasil já teve, poderia ter recebido um prêmio Nobel, o Nobel da Paz.

Poucos, no mundo, tanto se destacaram na mais nobre, e antiga, das missões humanas: a produção de alimentos. Comida gera paz”.

Acrescento à bela homenagem do Graziano a lembrança de que Paolinelli foi também muito atuante na política, tendo participado, como deputado federal, da Assembleia Nacional Constituinte de 1987, destacando-se no parlamento como ferrenho defensor do agronegócio moderno e competitivo, que faz do Brasil uma potência agroalimentar mundial.

Hoje o país, agradecido, colhe os abundantes frutos que ele plantou.

Categorias: OPINIÃO

1 comentário

walter Fagundes · 11/07/2023 às 19:54

A grande mídia nacional perdeu a oportunidade de dar a esse homem o reconhecimento que merece. Poucos brasileiros conheceram a história desse que foi o responsável pelo desenvolvimento do agro brasileiro. Nos apresentam tantos heróis que jamais foram capaz de salvar uma vida, e deixam ao esquecimento tamanha personalidade.

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