A privatização do STF
São cinco os requisitos constitucionais para alguém virar ministro do Supremo Tribunal Federal: 1) ser brasileiro nato; 2) ter idade entre 35 a 65 anos; 3) estar no gozo dos direitos políticos; 4) possuir notável saber jurídico; e 5) ter reputação ilibada.
O advogado Cristiano Zanin atende, obviamente, os três primeiros, mas não preenche o quarto e passa raspando no quinto.
Começando pelo último, ele tem sua reputação maculada por um processo em que é acusado de violar direitos trabalhistas de uma babá, entre eles não registrá-la em carteira, não pagar horas extras e não permitir folgas nos fins semana.
Aliás, Zanin é reincidente: ele e a esposa, Valeska Teixeira, já haviam sido processados antes por uma empregada doméstica, uma outra babá e um gerente administrativo também na Justiça do Trabalho.
No primeiro caso, houve condenação parcial do advogado.
Ainda que não se possa dizer que esses, digamos, pequenos acidentes de percurso, abalem sua credibilidade, é muito feio para um magistrado da suprema Corte ter fama de descumpridor de leis trabalhistas.
Já em relação à exigência do “notável saber jurídico”, o problema é mais sério.
Pegando a definição do professor Ives Gandra Martins, um dos maiores constitucionalistas vivos do país, “notável é aquilo que está acima da média do conhecimento de todos, o que inclui saber acadêmico, livros publicados, reconhecimento nacional e internacional como jurista. O reconhecimento acadêmico é ser mestre, doutor, livre docente ou professor titular, doutor honoris causa. É o que difere o advogado do jurista. O magistrado do jurista.”
Zanin pode ser um bom causídico, mas não se enquadra minimamente na qualificação estabelecida na Carta Magna.
Tal defeito, porém, não será uma pedra no caminho do advogado do Lula se considerarmos que nas últimas décadas foram raras as nomeações de ministros do STF dotados de notável saber jurídico. Muito pelo contrário.
Dito isso, o único fator, a estas alturas, que poderia impedir Zanin de ser alçado à mais alta Corte judicial da nação seria a barreira ética por ele ter atuado na Operação Lava Jato como advogado pessoal justamente do presidente da República que o escolheu para a poderosa função, critério que não está previsto na lei.
Ou seja, sua indicação não é ilegal, mas é imoral.
A situação faz lembrar o histórico episódio em que o ex-presidente Juscelino Kubitschek enfrentou uma tentativa de barrarem sua eleição e foi defendido pelo lendário jurista Sobral Pinto.
Vitorioso na contenda, JK queria agradá-lo e o indicou para o STF.
Polidamente, Sobral recusou, agradeceu e disse: “Imagine o senhor, se eu votar ao seu favor, o que vai acontecer. E se eu votar contra, o que vão dizer. Eu prefiro não aceitar”.
Mas eram outros tempos. Tempos em que havia, na vida pública, caráter, dignidade e honradez, virtudes hoje bastante escassas.
Para não dizer inexistentes.
1 comentário
Marcos Villanova de Castro · 21/06/2023 às 10:22
Muito oportuno vc lembrar do caso do Sobral Pinto, Caio. Nos dias de hoje, um episódio como esse tem chance zero de se repetir.