Governo bipolar: só Freud explica
Poucas vezes um governo revelou, com tanta clareza, os sintomas de uma crise de identidade. Em 2025, o Brasil é comandado por uma administração que caminha em duas direções opostas – e, não por acaso, está sem rumo algum.
De um lado, temos o Palácio do Planalto em ritmo de otimismo compulsivo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, declarou nesta semana que “podemos nos surpreender positivamente com a inflação”. Aposta tudo numa mágica combinação de safra agrícola, câmbio e geopolítica. É o tipo de fé que não se vê nem em retiros espirituais, compartilhada também pelo Lula, que insiste em prever uma expansão econômica robusta — mesmo com o mercado, as projeções e os próprios dados do governo dizendo exatamente o contrário.
Do outro lado, temos o Banco Central — agora inteiramente reformulado com diretores nomeados pelo próprio governo — emitindo alertas que destoam completamente do discurso oficial. O novo presidente da instituição, Gabriel Galípolo, homem de confiança de Lula, e sua diretoria fiel ao Planalto, divulgaram na quinta-feira o Relatório de Política Monetária que prevê desaceleração da economia, inflação persistente (motivo para a Selic ser mantida nas alturas) e rebaixamento do PIB deste ano de 2,1% para 1,9%. Em bom português: o crescimento vai minguar e o custo de vida continuará subindo.
A cereja do bolo está na ata do Copom, divulgada no último dia 25. O texto não economiza recados: aponta “esmorecimento no esforço de disciplina fiscal” e “incertezas quanto à estabilização da dívida pública”, dois fatores que pressionam a taxa de juros para cima. Traduzindo: o governo abandonou qualquer intenção séria de controlar gastos, e a dívida pública está se aproximando de um novo recorde histórico — alimentada por medidas eleitoreiras e crédito fácil. A conta não fecha, mas o estrago é coletivo.
Inconsequente como ele só, o Planalto segue despejando dinheiro na economia como se jogasse confetes em pleno carnaval. E foi exatamente isso que fez a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, quando apareceu em vídeo celebrando o chamado “empréstimo do Lula” — uma linha de crédito consignado para trabalhadores da iniciativa privada, lastreada no FGTS.
Com um tom de quem vende panelas no intervalo do programa da tarde, disparou: “Tá apertado? Juros altos? Pega o empréstimo do Lula!” O vídeo viralizou. As críticas também. Ficou escrachada a irresponsabilidade de induzir milhões de brasileiros, especialmente os mais vulneráveis, já atolados em dívidas, a se endividarem ainda mais. O vídeo foi apagado às pressas, como quem tenta esconder o fósforo após botar fogo no circo.
O problema, no entanto, não está no teatro. Está no fato de que o Banco Central já não pode mais ser tratado como “vilão independente”, como Lula tanto gostava de repetir nos tempos de Roberto Campos Neto. Agora, o BC é 100% do governo. É do time. É da casa. É do PT. Se há contradição entre o que diz Galípolo e o que faz Haddad, não se trata mais de embate entre Estado e governo — trata-se de um governo que fala uma coisa e faz outra, restando para a população pagar a conta dessa esquizofrenia institucional.
Populismo fiscal, dívida crescente, inflação teimosa, juros em alta e crescimento em baixa. Se isso é um plano, está muito bem disfarçado de improviso.
Enquanto um lado do governo sonha, o outro tenta acordar. E o povo, no meio, correndo o risco de cair da cama — direto na recessão.